quinta-feira, agosto 26, 2010

Da República da Corja - submarinos, helicópteros e tratantes

Acabei de ver uma reportagem SIC sobre as trapalhadas relacionadas com a aquisição dos submarinos, torpedos, helicópteros e carros de combate, em que milhões de euros relacionados com as compartidas se perderem por incúria ou má fé.
Em qualquer país democrático e “normal” isto seria um escândalo monumental, capaz de dar cabo da carreira política de primeiros ministros, ministros, secretários de estado, provocar o despedimento de inúmeros gestores públicos e a irradiação de várias chefias militares.
Num país como Portugal é apenas mais um caso perdido nos labirintos límbicos da chamada “Justiça”.
A República da Corja.

Sobre Fado e sobre Amália Rodrigues

A RTP2 tem emitido uns programas sobre fado, com especial incidência em Amália Rodrigues.
Desde miúdo que gosto de Fado, de uma forma instintiva. Sempre o percebi mesmo no tempo em que não o entendia. Nascido em 1964, o Fado, não era um género musical apreciado pela maioria das pessoas da minha geração, e nos meus tempos da adolescência, para não parecer mal, o meu gosto pelo Fado era cultivado quase na clandestinidade, quase com vergonha. Fases.
Por muitas que sejam as teorias, para mim o Fado é o cantar árabe reconstruído nas calçadas de Lisboa ao longo dos séculos. É assim que o Fado me soa e é assim que o Fado me faz sentido.
Não se pode falar de Fado sem falar em Amália Rodrigues. É incontornável e é-o porque a sua voz é única. Nunca ninguém o cantou como ela e duvido que alguém o cantará como ela o cantou.
Amália Rodrigues trouxe a grande poesia e os grandes poetas para o Fado e a sua voz a cantar esses poemas de excepção, com um fundo de guitarras, de guitarras portuguesas, é uma experiência estética e espiritual extraordinária.
Neste tempo de globalização, em que tudo procura ser igual em todo o lado, aprender a gostar de Fado é um acto de vanguardismo.
Por aqui e por ali têm aparecido grupos e formações musicais que têm produzido reinterpretações do Fado com muito interesse, mas isso não implica, bem pelo contrário obriga, a que não se ouça o Fado tal como ele é. Perfeito, eterno e que queiram ou não queiram, saibam ou não saibam, canta Portugal.
O Fado de Amália de Rodrigues.

quarta-feira, agosto 25, 2010

Sobre o fecho da Papelaria Fernandes

“Em comunicado enviado hoje à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a Papelaria Fernandes anunciou o encerramento de 12 das suas 14 lojas e a dispensa de 100 funcionários.
No passado mês de Julho, a papelaria divulgou os dados referentes a 2009, que davam conta de uma quebra de 64 por cento nas receitas face ao ano anterior, para os 4,6 milhões de euros.

A empresa teve prejuízos na ordem dos 17 milhões de euros, consequência dos custos relacionados com a redução de 280 postos de trabalho que custaram, em indemnizações, cerca de 4,7 milhões de euros.

Em 2009, a facturação da papelaria diminuiu 8,4 milhões de euros, em relação a 2008 e as dívidas alcançaram os 64 milhões de euros”
- "Público".

Mais uma casa comercial centenária que fecha as suas portas, atirando para o desemprego dezenas e dezenas de pessoas.
Fui cliente da Papelaria Fernandes anos e anos e este desenlace na me espanta e parece-me a mim que já estava planeado e que a recuperação sucessivamente anunciada não passou de um conto da carochinha. No último ano as lojas limitaram-se a liquidar stocks, sem qualquer reposição, mantendo, no entanto, abertas as lojas nas grandes superfícies comerciais cujos contratos de arrendamento são, por regra, leoninos. Não admira que a facturação tenha diminuído. Diminuiu deliberadamente, talvez para servir como argumento para o presente encerramento. Senão vejamos: como é que a facturação não tinha que diminuir se as lojas já quase não tinham produtos para vender e no entanto eram mantidos os estabelecimentos abertos a pagar rendas caríssimas? Só por milagre é que a facturação não poderia ter descido e os ordenados devidos aos trabalhadores poderiam ser pagos.
É mais uma história triste em que valores como respeito à “casa” – marca, trabalhadores e clientes – são esquecidos.
É o que deu a parolice de transformar empresas comerciais sólidas, com patrão com cara definida, em “grupos”.
“Grupos” de oportunistas especuladores é o que é.

sábado, agosto 07, 2010

Portugueses? Brandos costumes???

A perspectiva de um “povo de brandos costumes” foi idealizada e propagandeada pelo Estado Novo. Dava jeito ao imaginário da Ditadura, ruralista e autoritária, que era, nos seus contornos essenciais, a expressão do imaginário do próprio ditador, Oliveira Salazar.
Os Portugueses, nós, nunca fomos de brandos costumes. Já não o éramos antes de sermos Portugueses.
Nunca fomos de brandos costumes, em nenhum dos costumes. Costumes colectivos e costumes individuais. Costumes políticos e costumes sociais. Costumes culturais e até mesmo nos costumes económicos.
A violência esteve, está e estará sempre presente na nossa forma de ser. Pode não ser uma violência exuberante à espanhola, mas é violência. Violência que quando explode é terrível.
Esta violência que está presente em nós pode ser encontrada na Reconquista, na Expansão. Esta violência que está presente em nós pode ser encontrada na assistência aos autos-de-fé, nos crimes passionais e por causa da propriedade, no trânsito, nas bancadas dos recintos desportivos, no assassínio de reis, príncipes e presidentes, nas revoluções, guerra civil, intentonas e em reuniões de condomínio. Esta violência que está presente em nós pode ser encontrada à porta dos tribunais de hoje da mesma forma que estava na face dos assistentes aos desmembramento dos Távoras. Esta violência que está presente em nós pode ser encontrada nos sermões sacerdotais ou monacais e nos desrespeitar dos peões nas passadeiras ou dos motociclistas nas estradas.
Só somos brandos no assumir das responsabilidades e na condenação do iníquo. Basta ver que em Portugal a culpa nunca se casa – e casando-se depressa enviúva – e os corruptos são elevados a heróis com direito a reeleição. Mas esta é uma falsa brandura, na verdade é uma violência inaudita.

sexta-feira, agosto 06, 2010

A rapaziada do Tio Sam

Os Estados Unidos da América preparam-se para abandonar o Iraque. Mais uma vez a rapaziada do Tio Sam, após uma entrada de leão, tem uma saída de “sendeiro”.
Uma saída que deixa um país mergulhado num caos económico e social absoluta, com as suas principais estruturas destruídas. É verdade que já não tem Saddam Hussein ao leme, mas está a milhas de ser democrático e com todas as condições para fazer emergir vários “Saddam”.
Invadido por causa do petróleo, abandonado por causa da despesa.
A rapaziada do Tio Sam vai agora, ao que parece, concentrar-se no Afeganistão, ou seja vai consumir biliões de dólares e destruir muitas mais vidas humanas para, daqui a uns anitos, fazer o mesmo: sair à sendeiro.
O mundo começa a perceber Obama e as suas profundas limitações. A retórica é quotidianamente destruída pela força dos factos.
Guantanamo? Na mesma.
Conflito israelo-arabe? Na mesma.
Seja o Presidente norte-americano branco ou negro, democrata ou republicano é completamente indiferente. A máquina é a mesma e o dinheiro não muda de cor. É sempre verde-lodo.
Da mesma forma que é igual a ignorância, a arrogância e o espírito messiânico.
No entanto hoje há coisas que já não são o que eram. Há a China, há o Brasil, há a Índia e há uns EUA a espernear sem puderem ser mais o que já foram e sem saberem o que querem ser ou, sequer, o que podem ser.
O que se mantém igual é uma Europa presa nas suas profundas contradições, sem rumo e sem destino claro. E muita fome e miséria no mundo. E muitas vidas perdidas – ou mortas ou sem futuro que é quase a mesma coisa.